Por José Soares de Melo
Outro dia recebi um elogio sobre este Baú, acompanhado de uma pequena reclamação: disse o leitor (ou seria internauta?) que gostava dos textos aqui reproduzidos “apesar de ter umas palavras desconhecidas”.
Tem razão o internauta, pois hoje a linguagem é outra, principalmente para os mais jovens. Entretanto, gosto de escrever como a gente falava naquele tempo. Exatamente como os jovens gostam de escrever quanto estão teclando suas mensagens hoje, do mesmo jeito que se fala. Por isso, peço perdão pela dificuldade, e passo a relatar alguns fatos ocorridos nos tempos de antão.
Era uma segunda feira como outra qualquer. Sol queimando tudo, nenhuma brisa a aliviar aquele caldeirão fervendo. A feira estava desanimada, com pouco movimento. Pequenos grupos de agricultores, com sacos vazios enrolados na mão comentavam as dificuldades daquela que seria uma das piores secas do sertão. De repente, como se surgisse do nada, um verdadeiro furacão atinge a calmaria daquela tarde quente. Corre-corre, portas sendo baixadas às pressas, gritaria, um verdadeiro inferno. Na inocência dos meus dez anos, não entendia o que se passava. Para melhor apreciar aquela confusão, subi ao telhada da velha casa que ficava na Praça Padre Leão, de onde tinha uma visão privilegiada de tudo que acontecia. Trabalhadores pegavam sacas de feijão, farinha, milho etc., e saiam aos tombos, ajudados por companheiros. Foram poucos minutos aquele espetáculo grotesco, com uns tentando tomar de outros os produtos do saque. A calmaria voltou a reinar no “Quadro”, como era chamado o grande pátio que ficava em frente à Igreja, a velha Praça Padre Leão. Já nas saídas da cidade, acontecia um verdadeiro espetáculo de solidariedade entre os saqueadores: aqueles que conseguiram saquear algum alimento, dividiam o produto do saque com os companheiros que nada pegaram.
Aquelas cenas ficaram gravadas na minha mente para sempre. Não compreendendo a gravidade do drama que atingia a população, e ouvindo dos comerciantes a sua revolta com o que classificavam de roubo, eu concordava com eles. Era um absurdo o que aqueles homens faziam, roubando o que era dos outros. Levou bastante tempo para compreender a razão que levava aqueles pobres homens a gesto tão extremado. Mas minha percepção só ficou bastante clara em relação ao episódio, quando, certa vez, revendo antigos livros deparei-me com a tradicional “Carta de ABC”, instrumento que alfabetizou milhões de nordestinos. Na sua última página, último estágio do aprendizado da leitura, estavam relacionadas frases sob o título de “Máximas”. Uma delas me despertou para o significado da ação daqueles trabalhadores: “a fome dá ao pobre o direito de importunar o rico”. Não que os comerciantes da época fosse ricos, mas esses tinham mais que aqueles. E o que o homem do campo, sofrido, com fome, com sede, desesperado, precisava era de muito pouco. Não queria dinheiro, jóias, riquezas, nada disso. Queria apenas uma coisa. Simples. Essencial, e por isso indispensável. Queria comer, matar a fome de seus filhos. E isso foi o suficiente para compreender a razão dos “Ataques das feiras”.
JOAÉ MELO
ResponderExcluirMEU NOME É MARCOS EUGENIO, IRMÃO DE PETRONIO EUGENIO (TONA}). LENDO ESSE SEU ARTIGO DA INVASÃO DA FEIRA DE CUSTÓDIA, POR ACASO, EU ESTAVA BEM EM FRENTE A PREFEITURA, QUANDO ACONTECEU AQUELA INVASÃO E FICA A IMPRESSÃO QUE TAMBEM NÃO ENTENDIA NADA DAQUELA INVASÃO E EU DEVIA TER MAIS OU MEMOS A TUA IDADE. PARABENS PELO SEU ARTIGO, FOI EXATAMENTO ISSO QUE ACONTECEU
MARCOS EUGENIO