foto: Arquivo Célia Barros
Por José Melo
Janeiro/2013
Até
os anos oitenta, o São João em Custódia praticamente não existia,
restringindo-se apenas a queima das fogueiras, na cidade, e os famosos
forrós na zona rural. A partir daí começaram a surgir os arraiais,
espalhados pelas ruas da cidade, que juntavam os moradores daquelas
ruas, para brincar na beira da fogueira, com muita música, pamonha,
milho assado, bebidas, e muitos fogos de artifícios.
Mas,
São João autêntico mesmo, era aquele realizado na zona rural, há muitas
décadas atrás. A festa começava na véspera, e durante todo o dia as
atenções eram dedicadas a preparação da festa. Colher o milho verde,
plantado no dia de São José, para fazer a canjica, pamonha, bolo, pé de
moleque. Cortar a lenha, transportar e armar a fogueira; varrer o
terreiro, enfeitar com bandeirolas de papel de seda, e aguardar
ansiosamente o sinal para o início das festividades: o tiro da riúna,
desfechado no terreiro da casa, anunciando assim as homenagens ao santo
do nordeste.
A
fogueira era cuidadosamente preparada para ser acesa. A fumaça da lenha
verde fazia arder os olhos da meninada. Mas ninguém queria perder
aquela noite festiva, que se iniciava exatamente com as brincadeiras
dedicadas às crianças: pau de sebo, corrida do ovo, quebra panela,
cabra-cega, etc. Tudo isso sem falar nos fogos de artifícios,
entremeados pelo espoucar de tiros das riúnas e bacamartes.
Em
determinadas áreas da zona rural, formavam-se grupos de bacamarteiros,
com sua indumentária característica: calça e camisa de mescla Alvorada,
azul, alpargatas de rabicho, chapéu de palha quebrado na testa, tipo
cangaceiro, albornais à tiracolo, cartucheiras completas de munição de
festim. Saiam visitando a vizinhança e juntando novos componentes. Por
vezes, na manhã seguinte, já dia de São João, eles se dirigiam, cedinho,
à cidade, para encerrar as festividades. Era um verdadeiro rebuliço na
cidade. Tiros ensurdecedores, a fumaça fechava a rua, e aquele cheiro
horrível da pólvora com enxofre invadia as casas. Animados, tocavam
sanfona, e dançavam o xaxado exibindo orgulhosamente seus bacamartes. Em
alguns grupos chamava a atenção a presença de uma criança ou uma
mulher, devidamente paramentados, dando tiros de bacamarte. O
interessante é que naqueles tempos, por mais bebida que rolasse, por
maior que fosse o grupo, havia a mais perfeita ordem, jamais se
registrando qualquer caso de desavença ou confusão. Para isso, o Chefe
do bando impunha respeito e mantinha a ordem. Sua palavra era acatada na
hora, e quem o desafiasse, estava desligado do grupo.
Lembro
bem de um grupo famoso pelo número de bacamarteiros. Era o de Zé
Batista. Certa feita ele chegou a reunir cerca de trezentos
bacamarteiros, numa festa de inaugurações promovida por Luizito, e que
contou com a presença do Governador da época, Marco Maciel. Dizem que o
Governador, que não conhecia grupos de bacamarteiros, inicialmente, ao
descer do avião ficou assustado coma recepção: um verdadeiro bando de
“cangaceiros”, tão originais eram os componentes do Grupo de
Bacamarteiros.
Um
outro grupo famoso – esse não era de Custódia, mas de Sítio dos Nunes,
era o de Luiz Andrade. Todos os anos ele comparecia a Custódia, para se
encontrar com os grupos da terra. Figura carismática, Luiz Andrade tinha
traços dos “galegos” europeus: alto, branco, olhos verdes, corpulento e
voz grave.
Com
o passar dos tempos, os grupos foram diminuindo, e com a chegada de
novos entretedimentos, essa tradição praticamente acabou em Custódia.
Creio nem mais existirem os Grupos, apenas aqueles mais fanáticos, que
solitariamente ainda fazem ecoar pelos grotões da caatinga de Custódia, o
rebumbar dos tiros de bacamartes, talvez como um lamento pelo fim
daquela tradição, e um choro de saudade do São João de antigamente.
Foto: Elba Feitosa
Comemoração de São João entre 1973/74 no Ginásio Padre Leão ou Ernesto Queiroz.
Em pé: desconhecida, Tonho de Duquinha, Crystomeres, Luiz Cláudio Epaminondas, Elba Feitosa, Sérgio Murilo, desconhecida.
Agachados: Fernando, Ana Cláudia, Fábio (irmão de Fernando), Eliane Remigio, Adilson Veríssimo e Rejane Medeiros