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13 setembro, 2024

Um dos três mosqueteiros - (80 anos)

Dr. Pedro Pereira Sobrinho

Alguém designou um trio de jovens custodienses de OS TRÊS MOSQUETEIROS. Era formado pelo brilhante advogado tributarista e escritor Ernesto Queiroz Júnior, professor, membro de diversas academias, popularmente conhecido por Ernestinho, Sílvio Carneiro, Contador, Professor,  Prefeito de Custódia, e por Pedro Pereira Sobrinho, advogado, odontólogo e professor.

Hoje, dos três resta o Dr. Pedro, o último dos TRÊS MOSQUETEIROS. E é sobre ele que dedico estas mal traçadas, pelo muito que representou, como os outros dois,  para Custódia e paria várias gerações de jovens custodienses.

Nascido em 14 de julho de 1940, o garoto Pedrinho era o xodó de seus pais, o austero e estudioso Joaquim Pereira, e essa mulher extraordinária que foi Dona Corina. Ambos se dedicavam ao ramo farmacêutico, o que lhes proporcionava grandes oportunidades de ajudar os seus semelhantes, numa época em que a assistência à saúde praticamente não existia. 

Dona Corina era a salvação das pobres mães custodienses, quando aflitas não sabiam o que fazer com seus pequenos filhos acometidos de vários males. Sua experiência salvou muitas vidas, ao prescrever medicamentos para as mais diversas doenças dos pequeninos custodienses de então.

Levado pelo extremo zelo que seus pais dedicavam aos filhos, Pedrinho foi encaminhado nos estudos na capital pernambucana, onde adquiriu o diploma de Odontólogo, sempre retornando à terrinha durante as férias para rever os familiares, amigos e a cidadezinha que ele tanto ama.

Com o canudo na mão e mil ideias na cabeça, iniciou uma trajetória que rendeu muitos frutos, mais para Custódia e sua gente do que para si. Idealista por natureza, não se contentou com o diploma de odontólogo, ingressando na Faculdade de Direito de Caruaru, sendo um dos componentes das primeiras turmas daquela instituição.

Com o curso, dedicou-se mais ao Direito, onde destacou-se como um excelente orador, um dos melhores da região na sua época de ouro.

Agora com dois diplomas de cursos superiores, dedicou-se de corpo e alma ao que ele mais amava: educar. Antes de odontólogo ou advogado, Doutor Pedro Pereira foi um Educador na expressão exata da palavra. Lecionou por décadas, no Ginásio Municipal Padre Leão, Colégio Normal Municipal Ernesto Queiroz, e no seu Colégio Técnico Joaquim Pereira.

Não só a educação de Custódia deve muito ao dr. Pedro Pereira. Seu apego às coisas da nossa terra o fez Vereador, muito contribuindo para a mudança na forma de atuação dos edis custodienses. Durante sua gestão, desenvolveu ações junto ao então Prefeito – outro dos TRES MOSQUETEIROS, o Professor Sílvio e Carneiro, e com sua participação Custódia ganhou o seu estádio de futebol, o famoso Carneirinho, nome por ele dado ao nosso conhecido estádio.

Lembro do lançamento da “pedra fundamental” do Carneirinho. Um quatorze de julho, de ano que não recordo, dr. Pedro me convida para junto a outros amigos, fazer uma vistoria numa área de terra que ficava distante da cidade, cerca de dois quilômetros, no então Sítio Pindoba. Recordo que foi no dia 14 de julho por seu aniversário. 

Debaixo de uma jurema preta, sentamos formando uma roda em torno de um gravador mine cassete, última tecnologia da época, para registrar aquele momento. Recordo que estávamos, eu, o Dr. Pedro Pereira, Djalma Moisés, se não me engano presidente da Câmara de Vereadores na época, além de outras pessoas que não consigo lembrar. E alí foi lançada a ideia de transformar aquela área plana no campo de futebol, o que foi concretizado graças a ação do então Prefeito Sílvio Carneiro. 

Na ocasião dr. Pedro já batizou o estádio, homenageando o Prefeito Sílvio Carneiro,   afirmando que diferente da mania de grandeza de muitos da época, ao invés de chamar de CARNEIRÃO, o estádio seria o CARNEIRINHO, nome que “pegou” e ficou marcado para sempre.

Mas não foi só na educação e nos esportes que o dr. Pedro deixou sua marca. Muitas outras ações por ele desenvolvidas marcaram sua atuação. Criou e fez funcionar o curso de contabilidade, através do COLÉGIO TÉCNICO JOAQUIM PEREIRA, colaborou e muito na criação do Lyons Club de Custódia, na implantação de uma pequena repetidora de TV, instalada no Macambira, na criação e instalação da COOPERCUSTO, cooperativa agrícola com muitos serviços prestados aos agricultores, junto aos dois outros MOSQUETEIROS, Ernestinho e Sílvio  manteve por um bom período o semanário CUSTODIANAS, jornalzinho sensação da época, sempre colaborou na realização de eventos culturais, esportivos, recreativos, a exemplo de formação de equipes de futebol, participação nas festas populares, Carnaval, São João etc., 

Coletou centenas de causos do nosso folclore (pena se não os tem escritos), sempre colaborou com os gestores municipais, quer com orientação legal, quer como mestre de cerimonias, em suma, viveu intensamente a vida na acanhada Custódia de antigamente.

Ao completar oitenta anos, o Dr .Pedro Pereira lega aos seus filhos um exemplo raro de dedicação e amor a nossa terra, o que os obriga a continuar o seu histórico; aos custodienses, o respeito e a admiração pelo muito que fez por nossa terra e a todos pelo carinho e amizade sincera que sempre devotou a seus familiares e amigos. 

Sinceros parabéns meu compadre e amigo, o Bidoutor Pedro, como sempre o chamava.

Texto por
 José Melo
Recife-PE
Julho/2020

11 setembro, 2023

As Muitas Custódias - José Melo

 

Texto:
José Melo
Recife-PE
Setembro/2020

Hoje, é o aniversário das muitas Custódias. Da Custódia da Fonte de Sabá, recanto poético e de uma paisagem rusticamente bela; Custódia da Tambaú, orgulho dos Custodienses; Custódia do Café da Hora, ponto de encontro dos madrugadores da cidade de antigamente; Custódia de sua feira, incomparável pelo dimensão e diversidade de produtos nela expostos; Custódia da Rua da Várzea, recanto que abrigou a primeira fábrica de tanino da América do Sul; Custódia de seus bacamarteiros, que preservam a cultura local; Custódia do samba de côco, das toadas e aboios dolentes de vaqueiros; Custódia de artistas anônimos que preservam o verdadeiro Forró Pé de Serra, e daqueles que se projetam no cenário artístico regional e nacional; Custódia das memoráveis festas de São José; do São João autêntico, festejado anualmente em todos os sítios e fazendas; das festas de fim de ano, com a população enchendo a Praça Padre Leão, durante várias noites; das missões religiosas do Capuchinho Frei Damião, das missas e procissões que ainda hoje congregam milhares de fiéis. Custódia dos desfiles cívicos de 07 e 11 de Setembro, com a estudantada garbosa acompanhando a Banda Marcial Mauro César; Custódia dos profissionais famosos, que contribuíram para o seu crescimento: Mestre Ozório, na marcenaria; João Prefeito na mecânica; Duda Ferraz, na mecânica, eletricidade e muitas outras atividades; Toinho de Osório, na construção Civil; inúmeros profissionais que fizeram a história da indústria de calçados, os famosos sapateiros: Zé de Zaqueu, Cláudio Moisés, Israel, Manoel, Raimundo, Vavá, Alípio, Nezinho, e tantos e tantos outros que se torna impossível lembrar todos; Custódia da “Duas Américas”, a primeira “rádio” da cidade; Custódia de tantas figuras populares inesquecíveis: Zé Preto (do oito baixos), Pedro Dotô, os Gino (numerosa família do Alto), Paulino Caititu, Iôiô, Mila, Luiz Maraváia, Doca, Luiz Doido, e tantas pessoas que fica impossível citar todas; Custódia dos carnavais inesquecíveis: dos blocos do Cariri, de Alaíde, de Zé Motorista, das Canções carnavalescas “O Carcará” e “A Volta do Carcará”; dos craques do futebol, Toreba, Branco, Pelado Zequinha de Mestre Alfredo, Edmundo, Alfredo, Brasília e muitos outros. 

Essa a Custódia que hoje completa mais um ano de sua emancipação política, trilhando caminhos que a levam a um futuro promissor. Sempre amada, adorada, idolatrada por seus verdadeiros filhos. 

Parabéns, Custódia, rumo ao seu Centenário!!!



05 julho, 2023

LUIZITO E CORRELIGIONÁRIOS EM COMEMORAÇÃO INTERNA.


Foto: José Melo (Acervo particular)


Nosso colaborador José Melo, enviou foto de uma comemoração de fim de ano (provavelmente entre 1977 e 1978), realizada no gabinete do então prefeito, Luiz Epaminondas Filho. Hoje funciona no mesmo local, a Câmara Municipal de Vereadores. 

Aparecem na foto em ordem: Luizito (prefeito), Arnaldo Burgos (Vereador), Tenente Expedito (Delegado de Polícia), Djalma Moisés (ex-vereador), Zé Melo (Secretario de Administração), e Dr. Antônio Medeiros (Assessor Jurídico da Prefeitura).

Luizito, Djalma Bezerra e Zé Melo na Convenção do Arena

 


 
Sebastião Oliveira – na época Prefeito de Serra Talhada, Djalma Bezerra, então Prefeito de Custódia, José Rodrigues, então Prefeito de Triunfo, Luizito – candidato a Deputado Estadual, Gustavo Krause, governador em exercício na época, entre outros. 

O evento foi a convenção da ARENA, quando Luizito foi candidato a Deputado Estadual. O candidato a Governador foi José Múcio.

Colaboração: José Soares de Melo.

16 junho, 2023

Paulino "Caititu" - por José Melo


Texto: José Soares de Melo

Parece que estou vendo aquela cena, repetida tantas e tantas vezes, à beira da cacimba, escavada as margens do Riacho Custódia. A longa fila de latas, a meninada pintando o sete, as “ botadeiras d’ água” fofocando, enquanto aguardavam a vez de encherem suas latas da água que serviria para beber nos lares da cidadezinha que mal acordara. A grande maioria dos meninos vinha buscar água, em pequenas carroças improvisadas de caixotes, para o consumo doméstico, pois a água do Banheiro, como era chamado o chafariz público, era imprestável para beber, pelo alto teor de sal. Além deles, as “botadeiras”, com suas rodilhas e latas que equilibravam com maestria na cabeça, e alguns homens que ganhavam algum dinheirinho abastecendo os lares mais abastados, com seus galões, equipamento composto de duas latas dependuradas por cordas em um pau – pau-de-galão, que eles carregavam sobre os ombros.


Entre estes, um era a diversão da garotada. Paulino, caboclo de pele curtida pelo sol, que tinha uma mão deformada, consequência de um acidente em um equipamento das antigas fábricas de Caroá. Equipamento esse que era conhecido por Caititu, o que rendeu a Paulino esse apelido, que ele detestava e quando algum garoto gritava esse nome próximo dele, ele ficava literalmente louco. Jogava pedras, paus, o pau-de-galão, a cuia, o que estivesse próximo servia de arma.

Nessas ocasiões eram comuns as brigas entre os usuários da cacimba. Um dos motivos de constantes brigas, era o desaparecimento de cuias, que serviam para captar a água da cacimba e levá-la para a lata. Numa dessas, um gaiato botou a culpa do desaparecimento da cuia em Paulino e ele ganhou mais um apelido: “Ladrão de Cuia”. Não se sabe com qual apelido ele se enfurecia mais, se “Caititu” ou “Ladrão de Cuia”. Qualquer um dos dois era motivo para carreiras, pedradas atiradas a esmo, gritos enfurecidos, xingamentos às pobres mães dos trelosos garotos. Muitas vezes, não satisfeitos, eles seguiam Paulino, e em cada esquina gritavam os apelidos, corriam, se escondiam e esperavam ele se acalmar para em seguida voltar a provocar o pobre coitado.

E assim viveu Paulino até o dia em que o progresso acabou com a profissão dos “botadores d’água”: a chegada da água encanada encerrou aquele ciclo de vida em Custódia. E Paulino ficou na dependência de familiares até que o advento da aposentadoria do trabalhador rural trouxe para Paulino – acredite a sorte e o azar. A sorte porque ele pode viver durante algum tempo independente, com seu dinheirinho próprio para se manter. Azar porque a mesma aposentadoria que lhe dava o sustento, fez com que numa madrugada após o dia do pagamento do FUNRURAL, seu corpo aparecesse estirado sobre seu sangue numa ruela escura da cidade, vítima da violência que o progresso trouxe. Segundo dizem, foi morto pelo dinheiro da aposentadoria.


12 junho, 2023

Cacimba Nova - autor: José Melo

 


José Soares de Melo
Recife-PE
Março/2012

O título não tem nada a ver com a excelente música de Zé Marcolino, eternizada na voz do também eterno Luiz Lua Gonzaga. É apenas um rasgo de lembranças de um passado distante, sepultado que foi pelas águas do Açude Marrecas. Cacimba Nova era o sítio em que vivi memoráveis dias de felicidade na minha infância, dias que conseguiram gravar imagens indeléveis daquela paisagem, que começava na Fazenda Guarani, hoje transformada pela invasão urbana da cidade em ruas que compõem o Bairro da Redenção. Quantas vezes não fiz o percurso de nossa casa, nos fundos da mercearia de minha família, na esquina da Avenida Manoel Borba, com a Avenida Onze de Setembro! Cruzava a Rua deserta, cedinho, sob a névoa que dominava as manhãs da cidade, pegava a calçada do velho Grupo Escolar General Joaquim Inácio, e no final do seu muro cruzava o antigo campo de futebol, onde hoje funciona o Posto Tamboril.

A partir daí, um sombreado corredor composto por cercas de avelozes, com a estradinha macia, coberta de uma areia branca, muito fina, levava até a velha casa de meus avós, distante cerca de três quilômetros da cidade. Poucas casas no trajeto. A primeira, de um senhor,cujo nome era algo como Manoel Conceição; a seguir, uma pequena sequência de casebres de taipa, onde moravam a família de “Seu” Porfírio, e de uma senhora já centenária, cujo nome minha memória teima em não lembrar. Depois, já chegando ao Guarani, após uma curva, um pequeno quarto, onde funcionava a Bodega de João de Zumba. Mais a frente, a Fazenda que dava nome ao lugar, Guarani, com seu bangalô moderno, e um imponente Eucalipto ao lado. Agora a estrada já era mais estreita, com a vegetação quase que a recobrindo. Ao final daquele corredor, um velho umbuzeiro era parada obrigatória, quando em safra, para a colheita de umbus. A Casa de Henrique, meu parente, como quase todos que residiam naquelas bandas. Pertinho, o casarão de Tio Anízio Batista, que na verdade era tio de meu pai. Outras casinhas mais adiante, sempre de parentes. Os Raimundo, a “Tia Miné”, Minervina, outra tia do meu pai, a enorme Casa de “Tio Zé Batista”, que anualmente promovia o mais animado São João da região.

Cruzando o Rio da Marreca, logo após um pequeno trajeto, chegava a casa dos meus avós. Velho casarão cujas paredes mais pareciam as de uma igreja: cerca de cinqüenta centímetros de espessura. Porta larga e muitas janelas na frente. Um verdadeiro salão era na verdade a parte mais movimentada da casa: modestamente mobiliada – apenas um imenso e pesado banco de baraúna, algumas cadeiras, uma mesinha com o oratório, alguns quadros com gravuras de santos e fotografias da família e mais nada, além dos indispensáveis “armadores de rede”, feitos em madeira e encravados na largas paredes, servia como sala de visitas, capelas para as novenas, dormitório de redes estendidas quando a família se reunia, área de diversão da criançada quando o sol estava muito forte ou chovia, sem falar nos verdadeiros saraus literários que eram realizados nos finais de semana, com a família reunida para ouvir a leitura obrigatória do mais autêntico meio de propagação da cultura da época, e que era conhecido por “Romance”, como era conhecido o hoje famoso Cordel. Um corredor escuro separava aquele salão da Sala de jantar, e dividia a casa em duas alas com suas “camarinhas”, duas de cada lado, que era como chamavam os quartos. Na sala de jantar, uma comprida e pesada mesa, com duas cadeiras nas testadas e dois bancos nas laterais era o local das várias refeições diárias: o café da manhã, sempre a seis horas, o almoço, as dez horas, a ceia, as quinze horas e o jantar as dezessete horas, além dos lanches das crianças.

Nada me agrava mais do que após as primeiras travessuras do dia, ir para o “Reveso”, como chamavam um pequeno pomar que ficava em frente à casa, as margens do Rio.Colhia Goiaba, manga, banana, Graviola – que conhecíamos como “Coração da Índia”, caju e muitas hortaliças e verduras. No mesmo ficava a cacimba, a fonte de abastecimento da casa, durante o período de seca.

Achava interessante a minha avó preparar o xerém, moendo o milho numa espécie de moenda, composta por duas rodas de pedra, uma sobre a outra. A de cima dispunha de uma espécie de maçaneta e de um buraco, onde eram colocados os grãos. Girando a parte de cima, o atrito entre as duas pedras quebrava o milho, produzindo o xerém.

Da mesma forma era interessante quando minha avó ia “torrar” café. Os graus do café, misturados a pedaços de rapadura em uma panela fumegando espalha o cheiro forte do café por centenas de metros. Depois de torrado, o café se transformava no massa pastosa, extremamente preta, que era espalhada também sobre uma pedra lavrada, em formato de tábua, para esfriar e endurecer. Depois de frio, o café se transformava em uma espécie de pizza preta, que era quebrada e jogados os pedaços no pilão para ser socado até virar aquele pozinho amarronzado e de cheiro forte.

Na cozinha, o velho “Meu Louro”, que não escapava das brincadeiras da meninada. Tio Dué o ensinou a assoviar. Anos depois, não sei como, ele ensinou o papagaio a perguntar, sempre que alguém assoviava:

-“ Foi eu ou foi tu?”

Tio Dué caía na gargalhada, dizendo que o papagaio estava “caducando”.

No cercado que ficava após o curral, as margens de um riacho, um frondoso sombrião, com suas flores vermelhas era o abrigo certo para as brincadeiras da meninada, quando o sol queimava de quente. Algumas fruteiras, como pinha, manga e graviola nos forneciam preciosos frutos.

No terreiro da frente, a velha quixabeira, que abrigava do sol o velho e encardido carro de bois. Deitado nele sonhei muitos sonhos de criança livre, despreocupada e feliz.

Ao entardecer, não sei por que, mas sempre me sentia como que angustiado, naquele momento de paz, de solidão, no lusco-fusco da passagem do dia para a noite. Os pássaros iam encerrando suas sinfonias, o sol esmaecia no poente, os únicos barulhos perceptíveis eram os dos chocalhos que com seu som monótono anunciavam a chegada das vacas leiteiras do pasto, para a separação noturna de seus bezerros, que ficavam, no linguajar do sertanejo, “apartados” para preservar o leite da manhã seguinte.

E a noite assumia o lugar do dia, não raro com a presença mágica da lua, que enfeitava o céu azulado com sua claridade prateada derramando-se pelos terreiros, estradas e roçados. Estrelas brilhantes enfeitavam aquele cenário espetacular, deixando a todos embalados pela brisa fresca que varria os campos e chegava até a calçada do velho casarão, verdadeiro encantamento que me fazia teimar em permanecer até tarde observado aquele cenário.

Velhos tempos, belos dias que teimam em não sair da minha lembrança.


10 junho, 2023

Carí - Autor: José Soares de Melo

 


José Soares de Melo
Recife-PE
Março/2012


Anteriormente já falei de Carí, de sua participação no Bloco do Cariri. Como disse ali, efetivamente ela chefiava as mulheres de vida fácil no Sepitinga. Eram inúmeras, que viviam basicamente do faturamento que obtinham nos dias de feira, nas festas de São José, ou em incursões por outras cidades.


Mas o tempo foi passando, o crescimento da cidade foi aumentando, as habitações se aproximavam do Sepitinga, que era relativamente afastado do resto da cidade – ficava por trás das Avenidas Manoel Borba, Onze de Setembro, e da Rua Dr. Fraga Rocha. Com o passar do tempo as construções invadiram o que um dia fora a zona, e a profissão mais antiga do mundo teve que se render ao progresso: acabou a zona. As mulheres espalharam-se pela periferia, outras mudaram de cidade, e a chefe tomou uma decisão: abandonou a vida fácil e foi ser fazendeira, num pedaço de terra no sítio Catolé.

Lembro perfeitamente do visual adotado por Carí, quando passou a cuidar de seu rebanho caprino: calça e camisa masculinas – coisa rara naquela época, botas de vaqueiro, chapéu de couro, transformando-se assim numa autêntica sertaneja masculinizada.
Dava duro, plantava sua lavoura, cuidava de seu rebanho, enfim, levava uma vida igual a de milhares de bravos sertanejos.
Não se sabe como, surgiu no seu rebanho de caprinos, uma raça de bode com uma característica absurdamente estranha: os Bodes, apesar de Machos e bons reprodutores, davam leite! Sim, davam leite, sim senhor. É verdade que era pouco leite, mas dava. Isso chamava a atenção de quantos vissem, e não raro, muitos faziam questão de ir conhecer aquela coisa estranha para todos dali.
Recordo que em frente a sua casinha, à beira da Estrada que ia para Maravilha, havia uma cancela, que obrigavam os veículos a parar para poder abrir a cancela e passar. Sempre que passava lá eu ficava imaginando como é que Carí se adaptara a uma vida tão difícil como aquela. Hoje, creio que entendo porque ela se adaptou: é que a “as mulheres de vida fácil” que é como chamavam as profissionais do sexo, na verdade tinham uma vida muito pior que a dura vida do homem do campo.
Não sei o final dessa história. O tempo se encarregou de apagar o roteiro de uma vida que marcou tantas pessoas naquela cidadezinha. Talvez porque essas pessoas não quisessem ser lembradas como alguém que viveu àquela época, como se aquela vida fosse amaldiçoada. Ela foi uma líder coerente com sua condição de prostituta enquanto ralou na chamada “vida fácil”, e foi uma cidadã perfeita quando resolveu deixar aquela vida para trás.

José Soares de Melo

25 maio, 2023

São Pedro na Terra - por José Melo


 

Nosso Senhor Jesus Cristo
Chamou São Pêdo outro dia,
Dixe, vá na terra, essa sumana
Prum trabáio de valia
Vêja cuma tá o meu povo,
Me contá o qui há de novo
E vortá cum sete dia.

São Pedro chegou na terra,
Cum muita disposição,
Vêi parar im Pernambuco,
Bem no mêio do Sertão.
Pamode tudo obiservá
E vortar para contá,
Cuma tá a situação.

Duas sumana já passou,
São Pedro nun deu nutiça
Deus intão mandou pra ele
Um recado sem maliça
“Pedro, vorte ligêro
Sinão eu mando traze-lo,
Nem qui seja cum a puliça

São Pedro intão resolveu,
Pru Paraíso vortá.
Chegou pra Deus e passou,
As nuvidade a contá:
“No sertão tá bom danado,
Eita povo animado,
Achei bom tê ido lá”.

Lá tá tudo muito bom,
Tem fartura de cumida,
Buxada e sarapaté,
Tem quaiada iscorrida
Cuscuz cum leite e jabá,
Di tudo do mundo há,
Tá tudo uma boa vida.

São Pedro No Sertão

Quando é nas sexta-fêra
Tem forró no pé de serra,
Cum a sanfona gemendo
Cum a zabumba qui berra,
Digo cum satisfação,
Qui, hoje, lá o sertão
É o mió lugá da terra.

Tem festa de vaquejada,
Casamento e pescaria,
Futibó e pega de boi,
Samba, coco e cantoria
Lá ninguém vê a tristeza,
Muita fartura na mesa
Tudo cum muita alegria!

Intão Deus lhe perguntou,
Intão lá num tem mais fome?
Tu qui passasse esses dia
Junto cum aqueles home,
Me arresponda agora,
Tu visse arguma hora
Eles falá no meu nome?”

São Pedro li respondeu:
“Ingraçado, eu num vi.
Nuca falaro im seu nome
E se falaro eu num uvi
Mas isso eu agaranto,
Num falaro in nem um santo
De todos qui tem aqui.”

No outro ano, de novo,
São Pedro foi chamado.
Prá vortá de novo a terra
Aí ficou logo animado
Deus disse, vá, passe um mês,
Ou se quizer, passe três.
E me traga o resultado.

Saiu numa sexta-feira,
Logo no sabo vortô.
Foi direto ao Gabinete
Do nosso Pai Criadô.
E com o seu falatóro
Fez logo o relatóro
De tudo qui incontrou.

“Meu Senhor lá no sertão,
Ta uma seca danada
Num tem água pra bebê,
De comê num tem mais nada
Só tem sufrimento e peleja
Muita miséra e tristeza
A vida quaji acabada.

Deus então li perguntou:
Se São Pedro ouviu falá,
O nome de Deus ou de Santo,
Pur argum home de lá.
Respondeu: “É toda hora,
Quando resa ou quando chora
Tão sempre a se lembrá.

Tem resa missa e novena
Ladainha e Procissão
O povo muito contrito,
Cum o rusáro na mão
Clama pro nosso sinhô
Eita povo rezadô!
Veve só de oraçãqo

Isso prova qui o povo,
Quando tá no sufrimento
Se lembra de Deus e reza
Pra suportar o tormento
Mas se tá cum a vida boa
Brinca, pula e sorta loa
De Deus num lembra um momento.

José Melo
(Baseado em anedota popular)

22 maio, 2023

Meu sertão é mais mió


 

Sêo minino preste atenção
Num gostei de seu falá
Qui no sertão só tem fome
Confusão e fuzuá
Briga di terra e ingrisia
Pois tomém tem aligria
Arrepare o qui tem lá

Num tem coisa mais bunita
Qui o amenhecer do dia
A passarada cantano
Contente, cum aligria
A bizerrada berrano
As vaca a eles chamano
Nas menhã de brisa fria

Si num tem pão no café,
Tomém in compensação
Tem bolo feito de mio
Tapioca num farta não!
Tem a coiada iscurrida
Apois pra infrentá a lida
É perciso dispusição

No armoço tem fartura
Cum feijão bem temperado
Cum nata de leite e quêjo
De cuáio bem perparado
Cum farinha quebradinha
Rebate cum a caninha
E o cabra fica animado.

Si come carne de bode
Cum toda a famiança
Toicim de poico e galinha
Pra mode dar a sustança
Pois infrentando a batáia
O sertanejo trabáia
Disposto Cuma criança

De tarde inda tem mais
Pruquê a parada é dura
No mei da roça se come
Quêjo de Cuái e rapadura
Bebe a água friinha
Tirada de uma quartinha
Lá tudo é cum fartura

Di noite lá na varanda
Uma rede é armada
E junto cum a famia
As istóra são contada
Tirada dos foietim
Conta tim tim por tim tim
As istóra incantada

Di vez in quando inda tem
Um forró nos pé de serra
Cum a zabumba roncano
A sofona veia berra
Aquerdite si quizé
Mas eu li digo qui é
O mio qui tem na terra

As cabôca profumada
Cum o chêro das fulo
Vistido novo di chita
Junto cum o dançadô
Parece qui tão vuano
Os dois coipo se roçano
Tudo no maió amo

Tem mio não, sêo minino
Qui um forró arretado
Num é Cuma as dança nova
Qui se dança separado
É as moça dano sarto
Macho balançano os quarto
Isso é coisa di viado

Dispois desse desabafo,
Já fiquei mais sastifeito
Pois prifiro meu sertão
Mermo qui tenha defeito
Num quero mudernidade
Nem loucura da cidade
Eu sô assim desse jeito

Me adiscurpe si pudé
Num goto de lero lero,
Pru mode falá verdade
Nem um minuto ispero
Posso ter os meu defeito
Mas sou assim desse jeito
Inguinorante e sincero.

18 maio, 2023

[Causo] - Alma Pornográfica


 

Por José Soares de Melo 
Recife-PE
Março/2012

O primo Ozório Amaral, de saudosa memória, era um gozador nato. Jamais perdia a oportunidade de aprontar uma das suas.

No período da gestão do Prefeito Silvio Carneiro, anualmente nós servidores internos, inclusive Ozório, tínhamos um período em que trabalhávamos durante várias noites, na elaboração das Prestações de Contas anuais. E era comum Ozório aprontar das suas.

Como se sabe, existem muitas lendas de pessoas que ficaram ricas, após receberem um “ aviso” do outro mundo, indicando o local onde estaria enterrada uma botija cheia de ouro, prata e dinheiro.

Em uma noite em que estávamos trabalhando no antigo prédio da Prefeitura – onde hoje funciona Câmara de Vereadores, aproximadamente à uma hora da manhã, com a cidade completamente deserta, Ozório observou pelo basculante a aproximação de uma pessoa, que já se dirigindo para o trabalho, pára e ajoelha-se diante da Santa que ficava na gruta que havia no oitão da Igreja para rezar. 

Era um popular bastante conhecido por Zé da Telha, por trabalhar em olarias, na fabricação de tijolos e telhas. Oculto na escuridão, Ozório grita para Zé da Telha:

“ Ô Zé da Telha, tu quer enricar?”

Ao que Zé da Telha, de acordo com o ritual costumeiro nas aparições do outro mundo, faz o “ requerimento” :

- “ Te arrequeiro, alma, em nome do Pai do Filho e do Espírito Santo!”

E Ozório volta a perguntar:

“ Ô Zé da Telha, tu quer enricar?”

Ante a expectativa de conseguir um bom dinheiro com a botija, Zé da Telha responde todo animado:

“Quero!!!”

“Então vai dar o C….”

Com essa, Zé da Telha perdeu a compostura e o respeito pelo mensageiro do outro mundo e retrucou:

” – Vai dar tu, alma veia safada!” !!

13 maio, 2023

[Figuras de Custódia] - Ioiô


 

No retorno do “nosso” tão querido blog, decidi levar aos conterrâneos um pouco das minhas reminiscências, lembranças de minha infância que ficaram impregnadas para sempre na memória.

Nossa memória tem a característica de ser seletiva. Ela guarda aquelas cenas que mais marcaram na nossa vida, e entre estas, guardo até hoje lembranças de figuras que marcaram época na nossa Custódia. Marcaram não por seus feitos, suas bravuras, seus atos elogiáveis, mas apenas pela simplicidade, pela humildade, pela maneira humana de viver a vida, apesar de todas as agruras por que passaram.

A partir de agora, sempre que o tempo permitir, e a memória não se negar a processar esse arquivo inesgotável de lembranças, levarei aos internautas a minha concepção de algumas figuras custodienses que guardo na lembrança.

Vamos a primeira figura que despertou nas minhas lembranças.


IOIÔ

Ioiô foi um esmoler que percorria as ruas da pequenina Custódia entre as décadas de cinquenta e sessenta, sempre com um sorriso aberto, implorando para a caridade da população, para a sua sobrevivência.

Portador do mal de Parkinson, praticamente não falava, apenas balbuciava sons ininteligíveis, para pedir a esmola para a sua sobrevivência.

Herdou de seus antepassados, o costume de tratar todas as pessoas por Ioiô, no caso de homens, razão de seu apelido que apagou para sempre o seu nome de batismo, ou Iaiá no caso de mulheres. No caso de crianças, ele usava o diminutivo: Ioiozinho ou Iaiazinha.

Parece ver Ioiô, com seus músculos trêmulos, em uma das mãos um bastão para se apoiar e na outra uma improvisada tigela, feita da embalagem de queijo do reino, um “bisaco” à tiracolo para acumular o pouco que recebia dos piedosos irmãos.

Não sei porque eu sempre sentida por ele um profundo respeito, e me doía ver o seu sofrimento para se deslocar pelas ruas da cidade, com o corpo trêmulo, esmolando e agradecendo demoradamente a cada esmola recebida. 

Ioiô tinha a faculdade de ser um excelente benzedor, como se fala hoje, ou “rezador”, como se dizia na época.

Naqueles tempos, a maioria das mazelas da comunidade era tratada com ervas e com rezas. Estas, através de pessoas que tinha o dom da cura, segundo a crendice popular. Rezava-se pra tudo: mau olhado, olho grande, soluço, espinhela caída, doenças não identificadas, etc.

Interessante na reza contra o mau olhado, era que, segundo os rezadores, se após o final da benzedura, os ramos de ervas usadas pelo rezador ficassem murchos, era sinal de que a criança estava com bastante mau olhado.

A população de então acreditava piamente nos poderes das rezas. Tanto, que acreditavam no poder da reza para coisas inacreditáveis, como extinguir incêndios, curar dor de dente fazendo-o cair da boca, cura preventiva do veneno das cobras, e uma infinidade de utilidades que as rezas tinham. Vez por outra surgiam rezadores com poderes extraordinários na voz do povo. Lembro de um senhor que morava próximo à Vila de Rio da Barra, que de um momento para outro se transformou em um verdadeiro mito da benzedura, e com o sucesso perante a população, passou a residir em Custódia, para melhor atender aos necessitados. Morava vizinho a nossa casa, na então avenida Presidente Kennedy, e vi por diversas vezes sua casa se encher de populares em busca da cura para seus males.

Mas voltando a Ioiô, lembro que ele residia no alto que ficava por trás das Avenidas Onze de Setembro e Dr. Manoel Borba, próximo de outra figura emblemática de Custódia (de quem falarei oportunamente), que era Cari. O local era praticamente desabitado, com a existência de dois ou três casebres de taipa. Esse local fica exatamente na parte mais alta da Travessa Heleno Aleixo, hoje importante artéria de nossa cidade.

Todos os dias, religiosamente ele saía ás ruas da cidade fazendo as duas únicas coisas que podia fazer: esmolar e rezar em crianças acometidas do mau olhado, da “Dor D’ Ói”, que era como se chamava a conjuntivite, e de uma série infindável de males que acometiam as crianças da periferia de nossa cidade. 

Com o passar do tempo, a idade foi diminuindo a sua frequência nas ruas da cidade, até que por fim sumiu das ruas da cidade. Por sua simplicidade e humildade, caiu no esquecimento da maioria da população custodiense. No entanto, sua passagem terrena por Custódia serviu para ajudar a formatar o mesclado riquíssimo que foi a composição da comunidade custodiense, que vinha desde os mais simplórios e humildes personagens, aos integrantes de famílias tradicionais e abastadas. 

Presto, assim, minha modesta homenagem a essa figura simples, humilde, sofredora mas sempre sorridente, que foi Ioiô.

Zé Melo

10 maio, 2023

[Causo] Pra tudo tem solução

Por
José Melo Soares
Recife-PE
Junho/2020


Lembro que assisti um amigo de Luizito – Paulo Peterson o conhece, contando a situação de saúde seu pai, que gostava de tomar uma branquinha, e que esteve doente, tendo o levado para um amigo seu, médico. Disse ele:

- Luizito, pai esteve doente, e eu o levei para um amigo médico, que o medicou e fez as recomendações de sempre, entre elas a de parar de beber.

Ao que o senhor, desolado, perguntou:

- Mas Doutor, eu não posso tomar nem uma, de vez em quando?

- Não, a bebida pode lhe fazer muito mal.

Diante da insistência do velho senhor, o médico abriu uma pequena exceção:

- Veja bem, lá alguma vez, quando for tomar um banho, o senhor pode tomar uma, pequenina, hein?

Dias depois, o amigo de Luizito encontra o Médico que lhe pergunta:

- E aí, amigo, como está seu pai?

Ao que este respondeu:

- Está bem. Só que agora está tomando banho de minuto em minuto!!!

Um amigo irmão


 

Matriculado no Ginásio Municipal Padre Leão, conheci o Ferdinando Feitosa, que se tornou muito mais que um simples colega de escola. Carinhosamente chamado de Saruê, era extremamente alegre e brincalhão, característica que detém até hoje. Lembro que no início do primeiro ano ginasial, Ferdinando me deu uma ajuda. É que o Ginásio adotava um fardamento composto de calça e camisa na cor cáqui, e uma gravata azul marinho. 

A duras penas consegui a farda, mas não havia gravatas pequenas no mercado, e foi aí que Ferdinando me ajudou, pedindo à sua mãe, a sempre gentil D. Maria, que ao fazer a gravata dele também fizesse a minha. Nossa amizade só foi arrefecida pela distância. Ferdinando foi estudar no Recife, onde concluiu o curso de medicina e eu permaneci na pequenina Custódia. 


Anos depois foi a vez de conhecer aquele que foi realmente o meu melhor amigo: Feitosa, irmão de Ferdinando, Célia, Maristela, Lozinho e Tadeu. Minha amizade com Feitosa foi intensa, desse tipo de confiança plena e recíproca.

Colegas de trabalho – eu, secretário de administração, ele de finanças, da Prefeitura Municipal de Custódia, nas gestões de Luizito e Djalma Bezerra, sempre procurávamos atender a todos de forma civilizada e cidadã. 

Lembro que em um ano de seca braba, nós dois ficamos responsáveis pelos programas de emergência, o cadastramento dos trabalhadores, a fiscalização e o pagamento dos grandes contingentes de trabalhadores assistidos pelas frentes de emergência.


Durante anos trabalhamos juntos, com uma rotina sempre igual. Após o expediente, íamos tomar a tradicional “cervejinha” na Churrascaria Ribeiro, do nosso amigo comum Uilton, onde papeávamos bastante, bem como constantemente encontrávamos celebridades em passagem por Custódia. Assim, conhecemos Alceu Valença, Genival Lacerda, Paulo Diniz e muitos outros que vez por outra apareciam por lá na hora do almoço. 

O Feitosa tinha como característica a sinceridade, e uma solidariedade fora do comum. Sempre procurava ajudar os menos necessitados. Tinha sempre uma palavra amiga, e era um apoio para os amigos.

Com a eleição de Feitosa para Vice-Prefeito em Betânia, e a derrota de Luizito em Custódia, passamos a nos encontrar bem menos. Com a posse de Belchior na Prefeitura de Custódia, a quem combati na campanha eleitoral, e Custódia, pedi licença sem vencimentos, diretamente ao Prefeito, que numa demonstração de compreensão, ainda tentou me convencer a não me afastar do cargo, o que não me convenceu. Afastado da Prefeitura, passei alguns meses trabalhando em Barbalha no Ceará, na empresa de Luizito. Depois, retornei a Custódia, indo trabalhar na Fazenda Santa Rita, do então Deputado Ricardo Fiúza.


Deixando a Fazenda, fiquei desempregado e Feitosa tentou o máximo possível conseguir um trabalho para mim, na Prefeitura de Betânia, não sendo no entanto, atendido pelo Prefeito que ajudou a eleger. Depois foram dias difíceis para nós dois. Preterido em suas pretensões, Feitosa assumiu o cargo de Secretário de Finanças de Serra Talhada, cujo Prefeito era Ferdinando, seu irmão. Já na primeira oportunidade me deu uma ajuda: como eu estava desempregado, ele me contratou para emissão dos boletos de IPTU de Serra Talhada, o que vim a fazer improvisando equipamentos de informática que não tinha.

A morte de Feitosa foi um tremendo baque para mim. Era como se fosse meu irmão, tanta afinidade nós tínhamos.

Recordo que no velório, em Betânia, procurei a todo custo não me encontrar com Célia a sua esposa e também grande amiga minha. Eu simplesmente não sabia o que dizer a ela numa hora como aquela. Assim, fui me despedir do meu amigo, sempre procurando não ser visto por ela, no entanto ela me viu, e em prantos pediu que eu me aproximasse, não fugisse, pois a minha presença para ela era como se Feitosa estivesse ali, vivo, como sempre convivemos.

Ainda no decorrer da cerimônia, Ferdinando disse que precisava falar comigo. E ao final do dia, me convidou para assumir a função de Secretário de Finanças da Prefeitura de Serra Talhada, que exerci até o final do seu mandato.

Por Zé Melo