02 setembro, 2021

Lampião filosofa sobre Custódia



Por Clerisvaldo B. Chagas, 13 de junho de 2011

Entre a crueldade do punhal e a inteligência do chapéu, Seguia Virgulino Ferreira da Silva, assombrando os sertões de Pernambuco, Paraíba e Alagoas, até 1925, quando resolveu ampliar sua faixa de atuação. Foram anexados ao cangaço lampionesco, a partir de 1927, mais o Rio Grande do Norte, Ceará, Bahia e Sergipe. Afora os dotes militares, são incluídos os pendores listados por vários especialistas do cangaço, como os de parteiro, artesão, vaqueiro, almocreve, poeta e outros mais. 

No meio da sua parafernália, compartimentam-se suas “tiradas” filosóficas em diversas ocasiões, que soavam como uma espécie de sentença. Para um homem da roça que viveu toda a sua vida no meio rural, nos lugares mais esquisitos, aprendeu bastante com a sabedoria sertaneja, acrescentando da própria lavra essas tiradas ocasionais que se assemelham aos chistes característicos da região de São José do Egito, em Pernambuco. 

Mas suas tiradas eram sérias e decisivas, algumas delas captadas pela nossa coleção. Como exemplo, ele dizia, no caso de surgir várias soluções para um mesmo problema: “Homem, plano é o primeiro”.

De 1922 a 1925 atuando maciçamente nas fronteiras dos três primeiros estados, Lampião satanizava os sertões como terrível pé de vento. Era difícil de entender, então, porque ele entrara em Custódia, na época, vila da atual Sertânia, “amando e querendo bem” como costumava dizer. 

Em 11 de fevereiro de 1925, entrou na vila logo cedo e ficou aguardando que o povo acordasse, que as casas se abrissem. Estava com ele, entre outros, Mata Redonda, Fato de Cobra, Chá Preto, Chumbinho, Sabino, Sabiá e Jurema. Comeu, comprou, mandou fazer roupa, curativos em feridos, palestrou à vontade, não mexeu com ninguém. 

Ali gozou de um oásis temporário. Depois até Custódia entrou para o musical do cangaço com essa e outras quadrinhas, tudo indica, confeccionada dentro do bando:


“As moças de Custódia
São feias, mas têm ação
Guardam queijo e rapadura
Pra o bornal de Lampião”


Em Custódia, Lampião ainda foi à casa de um cidadão, sentou tranquilamente em sua calçada e falou para ele: “Você não disse que se eu entrasse aqui seria morto?” E diante do aperreio do morador, complementou na sua paz: “Deixe de besteira, homem, olhe eu aqui”. E não saiu sequer um cascudo.

Resolvendo enviar correspondência ao governo estadual dizendo coisas que por certo não agradaram ao destinatário, assim procedeu. Dizem que foi a única coisa que não pagou na vila de Custódia, filosofando após o ato, mais ou menos com essas palavras: “Isso aqui é do governo, por isso não vou pagar. Se eu pagasse estaria roubando a mim mesmo”.

Não sabemos se o bandoleiro soltou beijinhos, beijinhos na despedida, mas que ficou na história, ficou.

Ainda hoje LAMPIÃO FILOSOFA EM CUSTÓDIA.

Publicado originalmente: http://clerisvaldobchagas.blogspot.com/

Matéria enviada por José Melo
 

 

2 comentários:

  1. Cada vez fico mais surpreendida com suas reportagens. Parabéns!

    ResponderExcluir
  2. RÊGO É BOBAGEM.
    O governador alagoano, Pedro da Costa Rêgo, foi implacável perseguidor de Lampião,nos anos 30.
    Após romper mais um cerco da polícia alagoana, o rei do cangaço chegou a Santana de Ipanema, sertão de Alagoas e foi direto aos correios. Conta Antonio Sapucaia, no livro "O legendário Costa Rêgo" que o atrevido Lampião ditou um telegrama ao governador, que terminava assim:
    "-Pois fique o Sr.sabendo que tô acostumado a atravessar rio e saltar riacho. Quanto mais rêgo."
    Assinado: Capitão Virgulino Ferreira - Governador do Sertão.
    Fernando Florencio
    Ilheus/Ba

    ResponderExcluir