01 setembro, 2021

[Homenagem Póstuma - 88 anos] Gerson Gonçalves ícone do empreendedorismo - por José Melo




Por José Soares de Melo

Minha aproximação com o Sr. Gerson Gonçalves ocorreu nos meus quatorze ou quinze anos de idade. Nessa época, ele iniciava a vitoriosa trajetória da Tambaú. A fabriqueta ficava na Avenida Inocêncio Lima, bem próximo à ponte daquele logradouro. Ainda hoje lembro perfeitamente a imagem dele sentado em um banquinho, mexendo vagarosamente o doce fervilhando no tacho de cobre, instalado sobre “trempes” – três pedras que faziam as vezes de fogão, no meio do único vão que era toda a fábrica. Na entrada do prédio ficava a administração da pequena empresa. Um birô, uma cadeira e uma estante onde eram guardados os livros fiscais e o material de embalagem. Uma grande mesa era usada para recortar o papel celofane que servia de embalagem para os tabletes de doce de goiaba, e das famosas mariolas: o mesmo tablete de doces, sem a embalagem,  mas recobertos por uma camada de açúcar.

            Essa aproximação se deu porque na época ele tinha tendências políticas – a nível nacional, voltadas para a esquerda, e, para difundir isso, ele me convocou para vender exemplares do jornal “Última Hora”, que era a banda esquerda da imprensa da época. Diariamente eu recebia os poucos exemplares e percorria as ruas sem movimento da Custódia de então.

            Com o advento da revolução de 31 de março de 1964, o “Última Hora” saiu de circulação, e eu passei a ajudar na escrituração fiscal da pequena empresa, e na embalagem de doces.

            Na época, o quadro de funcionários da Tambaú era bastante reduzido: o próprio Gerson Gonçalves, sua cunhada Cícera Souza, e Alfredo, baixinho, forte, (jogava futebol no time principal da cidade), e que era o responsável pelo trabalho pesada da fabriqueta:  transportar  e cortar  lenha, fazer entregas e outros  serviços. Dois anos  depois ingressei no serviço público, me afastando assim da Tambaú.

            Sempre admirei o caráter de Gerson. O competente empreendedor que era nada tinha a ver com a figura do empresário que passa por cima de tudo e de todos em busca do lucro. Sempre respeitou os valores éticos, e procurava ajudar a quem necessitasse. Talvêz isso tenha contribuído para o crescimento firme e sólido da empresa. Todos que trabalhavam com ele tinham orgulho de colaborar com o crescimento da empresa. Em contrapartida, sempre reconhecia os méritos dos seus colaboradores, e quando a empresa já estava consolidada, todos os funcionários eram brindados com um verdadeiro banquete no dia do Trabalhador, prática que acredito ainda ser corrente na empresa. Cheguei a participar de um desses eventos, como convidado, em sua Fazenda, pertinho da cidade. Churrasco, bebida, e música para todos.

            Na década de setenta, com a eleição de Luizito para Prefeito, fui nomeado secretário. Com em toda eleição, após a posse correu o boato de que Luizito iria cortar o fornecimento da água do poço do antigo chafariz, que ajudava no abastecimento da fábrica. Paralelamente, aventou-se a possibilidade de, se isso viesse a acontecer, a Tambaú seria transferida, preferencialmente para Petrolina. Sabendo disso Luizito determinou a mim e a João Bosco, que, como emissários oficiais fôssemos até a Fábrica Tambaú, assegurar a Gerson que o fornecimento de água não só estava garantido, como ele poderia fazer novos poços se assim o desejasse. E nossa conversa com Gerson encerrou todos os problemas: ele acatou e confiou e tudo permaneceu como estava, com a Tambaú crescendo vertiginosamente, levando seus produtos e o nome de Custódia para todos os recantos do Brasil, e até para o exterior. Aliás, dessa eleição lembro um diálogo que mantive com Gerson. Eu era candidato a Vereador, e certa feita, no oitão da Igreja, ponto de encontro dos custodienses para botar o papo em dia – que não sei porquê cargas d’ água chamavam o encontro de “Pau do Urubú”, ele me perguntou porque eu não havia lhe pedido o voto. Sem nenhuma modéstia, eu respondi:

- Não pedi porque você só vota em quem acha o melhor, e como sou o melhor, você já ia votar em mim mesmo!

            Tempos depois ele me confirmou que efetivamente naquele dia já estava certo de votar no meu nome. 

            Nas comemorações do cinqüentenário de Custódia, a Tambaú colaborou bastante com as comemorações. Em uma sessão solene em que vários custodienses foram agraciados com uma plaqueta em reconhecimento a serviços prestados, Gerson foi um dos homenageados.

            Naquela ocasião eu fui surpreendido também como homenageado. Porém a maior homenagem que eu recebi naquele dia, foi um simples comentário de Gerson, sobre a citada homenagem. Após agradecer de público a plaqueta no menor discurso que já fiz na minha vida, recebi a melhor homenagem que poderia esperar: Gerson Gonçalves se dirigiu a mim e disse textualmente:

            - “ De todas as homenagens prestadas, a mais merecida foi a sua”.

            Sinceramente, fiquei sem palavras, ouvindo aquilo justamente da pessoa que eu mais admirava na cidade, o vitorioso empresário Gerson Gonçalves de Lima, esse ícono do empreendedorismo no Estado de Pernambuco.  
 
 

3 comentários:

  1. Uma correção: a eleição para o cargo de Vereador a que me referi no texto acima na verdade ocorreu na eleição anterior, e não quando Luizito foi eleito.

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  2. Sua eleição foi em 1972.Votei também com você. Tio Orlando estava doente no Hospital e me pediu pra votar com você. Eu confirmei que já iria votar pois éramos amigos desde o curso primário. Quanto a Gerson Gonçalves, já éramos torcedores do Sport desde eu menino.Lembro bem dele e Seu Ze Burgos. O Sport foi bicampeão em 61 e 62.
    Lembro também de Ozinaldo que trabalhava com ele.

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  3. Maravilha. Esses registros são importantes para preservar a boa memória de um tempo é dos homens que por ele passaram e deixaram perenes as marcas de sua paixão pelo bem fazer. Uma homenagem mais que justa.

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