24 fevereiro, 2013

Cemitério Pernambucano (Custódia)


A titulo de colaboração um pequeno comentário a respeito do Livro Quaderna nosso poeta maior, JOÃO CABRAL DE MELO NETO, onde ele nomeia nossa Custódia em um dos seus poemas.

O Livro Quaderna foi publicado primeiramente em Portugal, no ano de 1960. Sua escrita iniciou em 1956, quando João Cabral, trabalhando como cônsul, foi removido para Barcelona e autorizado a residir em Servilha, a fim de fazer pesquisas no Arquivo das Índias. No Brasil, foi publicado em 1962, juntamente com “os dois parlamentos” e “serial”, em um livro chamado Terceira Feira.

“Após tematizar a morte em “Morte e Vida Severina”, João Cabral a presentifica em Quaderna com os poemas dedicados ao cemitério. São quatro aparições que surgem localizados geograficamente no titulo a abaixo dele: “Cemitério Paraibano” (Entre Flores e Princesas), “Cemitério Pernambucano” (Custódia), “Cemitério Pernambucano” (Floresta do Navio) e “Cemitério Alagoano” (Trapiche da Barra). 

Tal localização, no entanto, demarca o espaço regional, mas acima de tudo, as descrições feitas permitem que sejam identificadas as regiões. Desse modo, percebe-se que a identificação geográfica precisa não impede ao poeta revelar, até mesmo no tratamento da morte, a diferença entre as regiões mais e menos favorecidas financeiramente.”

Em “Cemitério Paraibano” (Entre Flores e Princesa), João Cabral considera o cemitério uma casa. A comparação envereda para outro ponto, transformando-a em um espaço necessário e coletivo:

Uma casa é o cemitério
dos mortos deste lugar.
A casa só, sem puxada,
e casa de um só andar.

E da casa só o recinto
entre a taipa lateral.
Nunca se usou o jardim;
Muito menos, o quintal.

E casa pequena:própria
menos a hotel que a pensão;
pois os inquilinos cabem
no cemitério saguão,

os poucos que, por aqui
recusaram o privilégio
de cemitérios cidades
em cidades cemitérios.

Mesmo que delimite a região geograficamente, em “Cemitério Pernambuco” (Custódia), a descrição do espaço o aproxima do que foi representado no poema anterior. Percebe-se uma realidade semelhante à que foi descrita, ao revelar a dificuldade financeira que assola seus habitantes e os acompanha na morte:

E mais prático enterrar-se
em covas feitas no chão:
ao sol daqui, mais que covas
são formos de cremação.

Ao sol daqui, as covas logo
se transformam nas caieiras
onde enterrar certas coisas
para, queimando-as, fazê-las:

assim, o tijolo ainda cru,
as pedras que dão a cal
ou a capoeira raquítica
que dá o carvão vegetal.

Só que nas covas caieiras
nenhuma coisa é apurada:
tudo se perde na terra,
em forma de alma, ou de nada.

Além de apontar uma situação social, o poema mostra uma região precisa: o sertão pernambucano, castigado pela ação da natureza, salientando a presença do sol escaldante como elemento de identificação do espaço. O sol do sertão é severo, duro e cumpre a sina de “cremar” os corpos lançados ao chão. Também verifica-se a junção de dois elementos: a terá e o fogo (sol). O primeiro esconde, e segundo dá fim ao corpo sertanejo, mas, nem por isso, consegue livrar-se do que o move: sua alma. Então, a terra parece herdar a essência do interior do corpo extinto, sua alma, mas movendo a dúvida a respeito de sua existência, salientada nos últimos versos.

Material enviado por Marcelo Genário Burgos Pereira)

Nenhum comentário:

Postar um comentário