05 agosto, 2021

De frente com José Major - por José Carneiro


Zé Carneiro e Zélia filha de Zé Major


José Major só tinha de militar o nome. Um homem alto, robusto, moreno, educado, fala mansa e pausada, sempre bem trajado, bom e de agradável palestra. Fumava. Mas, infelizmente, por culpa do destino, não via onde pisava e nem sabia por onde seguia, sempre dependendo dos outros: era cego!

Morava na várzea, numa casa cercada de árvores, um sítio de onde tirava o sustento da família, com criação de gado. Nunca soube o seu nome de batismo, apenas que tinha Sá como sobrenome e se não me engano tio ou irmão de dona Maria Josefina, mulher de Ernesto Queiroz. Era casado com Dona Firmina e pai de Socorro, Nizinha e Zélia Sá(foto).

Tela com José Major e Dona Firmina

Zé Major era cego dos dois olhos, mas era um cego que via mais do que muita gente de boa visão. Ele via pelos ouvidos e achava que o pior cego é aquele que não quer ver. Dona Firmina, além de extremosa consorte, foi a mulher mais trabalhadeira que conheci e as filhas as mais amorosas da face da terra, sem deixar de mencionar o servo fiel, seu eterno guia Dema. Não resisto à tentação de falar da beleza de Socorro, um morenaço de fechar o comércio, como se rotulava na época uma mulher formosa como ela, que se assemelhava às mulatas do Rio de Janeiro, tão decantadas por Chacrinha e Sargentelle. Com os meus olhos de namorador mirim, era assim como a via, com muita simpatia, apreciando sua maneira coquete de ser e admirando seu corpo escultural, cujas pernas, me lembro ainda, eram um capricho da natureza. Com todo respeito!

Eu gostava de Zé Major e ele, por sua vez, demonstrava gostar de mim, talvez pela atenção que eu lhe dispensava. Costuma fazer ponto numa casa perto da minha, parece-me que a residência de Dona Domdom, mãe de Né Marinho, e quando eu assomava à porta ele dizia: Zé Carneiro? Reconhecia-me pelas pisadas. Nunca o vi lamentando sua cegueira. Acho que ele, mesmo sem conhecer, seguia o pensamento de Padre Antônio Vieira, o dos sermões: ”Os olhos foram feitos para ver e para chorar. Mais para chorar do que para ver. Por que os cegos não veem mas choram”.

Visitei muitas vezes Zé Major na Estrada da Imbiribeira, em Recife, onde morava com a mulher e as filhas Nizinha e Zélia. Ele se alegrava com a minha presença e falava muito de Custódia, perguntando por tudo e por todos, com um profundo sentimento de amor e saudade.

Zé Major uma legenda viva de nossa terra! 

JCarneiro [In Memorian]




2 comentários:

  1. Excelente mergulho em suas gostosas lembranças, hem meu caro Zé Carneiro? Lindas recordações, perfeita narrativa e ótimo registro da história humana da nossa terra. Parabéns!

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  2. A fotografia que encima esta matéria foi feita por ocasião do PRIMEIRO ENCONTRO DOS CUSTODIENSES NO RECIFE, levado a efeito no Clube dos Oficiais da Policia Militar de Pernambuco
    Um pergunta: A quanto tempo esses dois - Zé Carneiro e Zelia Sá - não se viam.? Isto é história, isto é Custódia,isto e ser custodiense.
    Fernando Florencio
    Ilheus/Ba

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